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sábado, 11 de abril de 2020

EPISÓDIOS APÓCRIFOS DA SEMANA SANTA EM ANDRELÂNDIA



Em Andrelândia – uma importante localidade do Sul de Minas Gerais -  a celebração dos últimos atos da vida de Cristo é uma tradição de quase três séculos, tempo mais do que suficiente para o surgimento de “acontecimentos memoráveis” durante as semanas santas.

Conta-se que, no início do século XX, surgiu a ideia de inovar a celebração da semana santa andrelandense. Para além das costumeiras missas e procissões, seriam feitas encenações dos últimos feitos de Jesus durante sua vida terrena. 

Mas a iniciativa foi um verdadeiro desastre...

Os organizadores do evento, de maneira ingênua e desprecavida, escolheram para fazer o papel do principal centurião e algoz de “Cristo”, um inimigo do rapaz que representaria o Mestre da Galileia. 

Não deu outra. 

O centurião, vislumbrando a possibilidade de acertar contas com o seu desafeto, “tomou todas” no dia da representação e desceu o relho nas costas do “Cristo”, que, indefeso mas ciente da importância de seu papel e do exemplo que deveria dar, chegou a advertir:

- Pare com isso irmão ...

Mas de nada adiantou a advertência. 

O centurião continuou o flagelo de forma tão real quanto se imagina ter acontecido com o verdadeiro Filho de Deus, protagonizando cenas parecidas com as do famoso  filme de Mel Gibson...

Não aguentando mais aquela situação, o “Cristo” jogou a cruz para o lado e, mais feroz do que na ocasião da expulsão dos vendilhões do templo,  saiu no braço com o seu carrasco, que, mais pra lá do que pra cá, acabou levando uma tremenda surra.

Chamado para apartar a “briga sagrada”, o padre da época fez como Pilatos: lavou as mãos e chamou o delegado de polícia para resolver o incidente.

Dizem que o “Cristo” foi levado preso para a delegacia e, meio confuso com tudo aquilo, não sabendo discernir a realidade da ficção que encenava naquele dia, ao ser algemado saiu com esta:

 - Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem.

Mais recentemente, passado o mal-estar daquele trágico acontecimento, o CECAN (Centro Cultural Andrelandense), se dispôs a organizar novamente as encenações da Paixão de Cristo, o que tem sido um verdadeiro sucesso, atraindo muitos turistas para Andrelândia   por ocasião da semana santa.

Contudo, no final da década de 1980 ocorreram dois fatos curiosos envolvendo a encenação.

O primeiro deles se deu  em frente à Matriz, quando era feita a representação do julgamento de Cristo. 

No papel do criminoso Barrabás estava um conhecido nosso, famoso por gostar de apreciar, sem moderação, as cachaças da Terra de André. Ocorre que a encenação atrasou bastante naquele dia e o personagem  estava lá, algemado com grossas correntes, há várias horas aguardando ser libertado. As cangibrinas anteriormente ingeridas foram perdendo o efeito e bateu em Barrabás uma vontade danada de tomar mais umas.

Finalmente chegou a hora de Pilatos indagar à multidão:

- Qual quereis que vos solte? Barrabás ou Jesus, chamado Cristo?

Para surpresa de todos, antes da multidão responder “Queremos Barrabás !”, o próprio criminoso tomou a iniciativa e gritou com todo o ar dos pulmões uma frase de conteúdo inédito segundo os maiores estudiosos da Bíblia.

 - Me solta que eu quero pinga !

Ao ser libertado, Barrabás tirou uma reta e ingressou lépido no Bar do Dito, onde tomou um liso da marvada e, já pensando no ano próximo, preocupado com as agruras do seu futuro como artista da semana santa, indagou ansioso:

- Será que Barrabás pode usar cantil ?

Outro fato muito curioso ocorreu no dia seguinte,  quando se encenava a crucificação de Cristo no Morro do Rosário.

Depois de ali subir carregando uma pesada cruz de madeira, o “Cristo”, já exausto, foi amarrado a uma cruz mais resistente, sendo esta içada por cordas e fixada a base de sua trave vertical em um buraco  previamente cavado.

 Acontece que o buraco havia ficado largo demais e como ventava muito naquele dia, o “Cristo” era arremessado juntamente com a cruz ora para frente, ora para trás.

O “Mestre da Galileia” conseguiu aguentar aquele vai-e- vem por algum tempo, mas justamente quando chegou a hora de pronunciar suas derradeiras palavras: Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito”, uma forte corrente de vento empurrou bruscamente o Cristo para trás. 

Foi aí que surgiu um substitutivo pouco santificado para as suas últimas palavras. 

Apavorado, com medo de ser lançado ao chão,  Cristo” exclamou dirigindo-se a um centurião:

-         Segura a pôrra dessa cruz aí, viado !

Felizmente o fio do microfone havia se rompido com o brusco arremesso e poucos foram os que escutaram o conteúdo daquela frase apócrifa.

Mas eu fui um deles...

domingo, 5 de abril de 2020

SEMANA SANTA: PATRIMÔNIO CULTURAL E RELIGIOSO DE ANDRELÂNDIA


A celebração da Semana Santa é uma tradição de mais de duzentos anos em Andrelândia, razão pela qual pode ser considerada como valioso patrimônio cultural e religioso da nossa cidade.

Sabe-se que desde os tempos do Arraial do Turvo que toda a   comunidade sempre  dedicou especial atenção  a esse momento, época de reunir as famílias, reencontrar os amigos e participar das celebrações religiosas, seguindo as procissões ao som da banda local e pedindo bênçãos a Deus.


Nas duas semanas imediatamente anteriores à celebração os preparativos sempre envolveram a capina das ruas e a pintura dos meios-fios com cal. Assim, era comum se falar antigamente que fulano de tal estaria na cidade "na capina", o que significava que chegaria na véspera da Semana Santa. 


 Programação da Semana Santa em 1934

Também era muito comum promover a pintura das fachadas das casas em tal período, de forma que a cidade ficasse bem cuidada  para a esperada ocasião.

  Programa da Semana Santa de 1949

Na véspera do Domingo de Ramos promove-se, nas capoeiras da zona rural,  o corte das folhas de Aricanga (pequena palmeira nativa) que são preparadas com cuidado para a procissão do dia seguinte, para os mais antigos chamada de Procissão da Aricanga, que marca o início das celebrações.

 Procissão da Aricanga


Na segunda-feira a milagrosa imagem do Senhor dos Passos é levada, em procissão, da Igreja Matriz para a Igreja do Rosário.

 A veneranda imagem do Senhor dos Passos protege o
 nosso povo há dois séculos

 Na terça-feira, pela manhã,  ocorre a Procissão da Rasoura, com a imagem do Senhor dos Passos percorrendo o bairro do Rosário.


À noite ocorre a famosa Procissão do Encontro, quando a Mãe Maria e Senhora das Dores encontra-se com seu Filho em ponto específico da cidade, logo acima do prédio da Prefeitura, onde existia o antigo "Passo do Encontro", demolido por volta de 1950.



Antigamente, somente homens acompanhavam a procissão do Senhor dos Passos e somente mulheres a de Nossa Senhora das Dores.

Procissão do Encontro - 1914

Após a Procissão  do Encontro a imagem de Nossa Senhora das Dores é levada para a Igreja do Rosário.
 
 Semana Santa em 1922
Na quarta-feira, pela manhã, é realizada a Procissão da Rasoura de Nossa Senhora das Dores, pelo bairro do Rosário.
À tarde ocorre a Procissão das Dores, com o retorno da imagem da Mãe de Cristo para a Matriz.

  Semana Santa em 1926

A quinta-feira é dia de preparação espiritual e confissão na Igreja Matriz, com missa campal celebrando a instituição da Eucaristia defronte a Igreja Matriz.

A Sexta-feira da Paixão sempre foi considerada como o dia de maior respeito e importância pelos andrelandenses, sendo muito concorrida a celebração realizada, à noite, na escadaria da Igreja Matriz, quando ocorre o tradicional "Sermão do Descendimento da Cruz", seguido da Procissão do Enterro, com o toque de marchas fúnebres pela Banda São Pio X. 

 Celebração da Sexta-Feira da Paixão

O Sábado de Aleluia e o Domingo de Páscoa são  considerados dias de alegria, agradecimento e comemoração pela vitória de Cristo e sua subida ao Pai, contando com missas e adoração ao Santíssimo Sacramento.

 Semana Santa 1971

No Domingo, pela manhã, ocorre a Procissão da Ressureição e à noite a Procissão de Nossa Senhora das Dores encerra as celebrações.



 A  expressiva imagem de Nossa Senhora das Dores, que acompanha o povo andrelandense desde o século XIX

Tradicionalmente, no domingo  as famílias se reúnem durante o almoço como derradeiro momento de confraternização. Logo após os visitantes e familiares que moram em outras cidades vão se despedindo e fazendo planos para o novo encontro na Semana Santa do ano vindouro.

E assim a Semana Santa vem sendo celebrada em Andrelândia há mais de dois séculos !

Conserve e valorize esse patrimônio !