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domingo, 24 de dezembro de 2017

O CRIME DO PEÃO PAULINO FRANCO EM CARRANCAS



Em 1892 aconteceu em Carrancas, então Distrito do Turvo, um dos episódios mais trágicos da história de nossa região.

Havia chegado há pouco no arraial de Carrancas um domador de burro bravo, natural do Uruguai, com cerca de 30 anos de idade, chamado Paulino Franco, que era exímio montador de bois, laçador e vaqueiro, por estar acostumado com essas lidas na região do Rio da Prata.

Bom de serviço e muito prestativo, trabalhou nas Fazendas da Rocinha e das Bicas, em Carrancas.



Ocorre que Paulino se apaixonou por uma linda moça de 18 anos, chamada Maria Jorgina Ribeiro, filha de Zeferino Jose Garcia e de Maria Madalena das Dores, a quem tentou desposar. Contudo, Paulino foi recusado pela família da moça, que não admitiu a proposta de namoro, fato que era bastante comum à época.

Durante um leilão realizado na festa da Padroeira da Cidade, o leiloeiro ofertou uma prenda inusitada: uma tábua. Vários circunstantes começaram a dar lances pela prenda dizendo que era para ser de Paulino Franco, que estava presente. Não entendendo a zombaria, Paulino perguntou o que aquilo representava a Rosendo Andrade, que lhe esclareceu que era um símbolo de rejeição por uma mulher.

Paulino ficou envergonhado e furioso com a brincadeira, prometendo vingança.


O peão Paulino Franco
Acervo de Itabyr Carvalho


No dia 10 de dezembro de 1892 ocorria um baile no casarão do Sr. Antônio Francisco de Souza Andrade, situado na Praça da Matriz. Paulino havia preparado sua vingança, deixando seu animal amarrado nas proximidades para empreender fuga após a execução de seu plano diabólico.

Logo ao entrar no salão de baile, Paulino apunhalou Maria Jorgina covardemente pelas costas, lançando-a morta ao chão. Acuado pelos presentes, Paulino, de faca em punho, dizia que quem se aproximasse teria o mesmo fim de Maria Jorgina.

Tentou esfaquear Rosendo Andrade e conseguiu atingir  o turvense Antônio Pereira Gustavo na barriga, mas este sobreviveu.


Maria Jorgina Ribeiro, a vitima de Paulino Franco
Acervo de Itabyr Carvalho


Entretanto, Américo de Souza Andrade conseguiu se apoderar de uma tranca de porta e atingir Paulino na cabeça, pelas costas, vindo ele a cair ao chão.

Parentes e amigos da família da vítima amarraram-no ao pé de uma mesa de madeira, onde o assassino ficou preso até o raiar do dia, quando deliberaram linchar e matar o uruguaio, pois não confiavam na justiça e temiam a fuga do assassino, que tinha fama de ter pacto com o demônio.

Conta-se que, durante a noite, Paulino teria ficado insultando a família da vítima, dizendo que quando ele fosse solto, iria voltar a Carrancas para desenterrar os ossos dela e fazer um patuá.

Na manhã do dia 11 de dezembro de 1893 Paulino foi levado para a Praça, onde começou a ser apedrejado e alvejado por dezenas de tiros, após ter sido amarrado no pé do cruzeiro. Contudo, passaram-se horas e ele não morria, o que fez aumentar sua fama de ser sobrenatural, que tinha o corpo fechado.


Paulino Franco foi assassinado defronte a Igreja Matriz de Carrancas

Uma benzedeira afirmou que somente uma bala de cera benta poderia matar Paulino. Então, buscaram uma vela benta na Igreja, esculpiram uma bala e colocaram em uma espingarda, disparando-a contra o corpo ensanguentado do moribundo, que, finalmente, veio a falecer por volta das 9.00h.

Queriam queimar o seu corpo, mas o Coronel Antônio Andrade não permitiu, mandando um camarada cavar uma sepultura de fora do cemitério, onde o corpo de Paulino foi enterrado, após ser para lá arrastado em um cavalo.

O assento do seu óbito é de teor seguinte:

“Aos onze dias do mês de Dezembro de mil oitocentos e noventa e dois, neste districto de paz da parochia de Carrancas, termo e Comarca do Turvo, Estado de Minas Gerais, em meu Cartorio compareceu o primeiro Juiz de Paz, Antônio Jose Correa e em presença das testemunhas adiante nomeadas e assignadas declarou: que no dia, mes e anno supra, na Praça Publica desta freguesia, foi assassinado PAULINO FRANCO, natural do Rio da Prata, de trinta annos presumiveis, pião, de filiação desconhecida, que ignora si é ou não casado, residente, ha pouco tempo neste districto, não deixou testamento e vai ser sepultado no cemiterio desta freguesia. E para constar lavrei este termo em que assigno com o declarante e as testemunhas Misael Franco de Carvalho e Antônio Leandro Ferreira, que attestam por conhecimento que o assassino é o mesmo mencionado neste termo. Eu Affonso Celso Ferreira,  escrivão de Paz, o escrevi e assigno. Affonso Celso Ferreira: Antônio Jose Correa: Antônio Leandro Ferreira: Misael Franco de Carvalho.

Os bens de Paulino Franco (cavalos, éguas, trastes de vaqueiro e roupas) foram arrecadados pela Justiça da Comarca do Turvo e levados a leilão em 1893.






Foram acusados do assassinato  11 réus, alguns como autores e outros como partícipes, segundo noticiado pelos jornais A Cidade do Turvo e o Amigo do Povo.

Os réus foram levados a julgamento perante o Tribunal do Júri do Turvo em 01 de setembro de 1893, sendo absolvidos por unanimidade após defesa apresentada pelo Dr. Ernesto Braga, em sessão presidida pelo Dr. Isidro Pereira de Azevedo, funcionando como Promotor de Justiça o Dr. Antônio de Souza Lima Motinha.


Notícia da absolvição dos acusados - 1893

O caso gerou grande comoção na região de Andrelândia e, ainda hoje, é  muito comentado pelos mais antigos.

Maiores informações sobre os fatos podem ser obtidas nos livros e links abaixo:



AMATO, Marta. A Freguesia de Nossa Senhora das Carrancas e sua história. São Paulo: Loyola, 1996.

AZEVEDO, Álvaro de. Andrelândia. Fatos de sua vida político-social. Rio de Janeiro. 1954.

Embornal de Causos - "Quem conta um conto, aumenta um ponto - a utilização das novas mídias como veículo de preservação do patrimônio imaterial", realizado em 2010 e hoje como PROGRAMA DE EXTENSÃO da UFSJ". O caso do peão Paulino - Balbino de Souza Rezende


Embornal de Causos - "Quem conta um conto, aumenta um ponto - a utilização das novas mídias como veículo de preservação do patrimônio imaterial", realizado em 2010 e hoje como PROGRAMA DE EXTENSÃO da UFSJ". Outra versão do caso do "Peão Paulino"

QUADRO RETRATA HISTÓRIA DE ANDRELÂNDIA




Instalado no interior do sobrado onde funciona a Fundação Guairá, um  belo painel pintado em 2011 pelo artista Fernando Bonorino retrata a trajetória histórica de Andrelândia e os seus principais pontos históricos.

Pinturas rupestres da Serra de Santo Antônio, Igrejas Matriz, do Rosário, São Benedito,  e da Congregação Cristã, Estação Ferroviária, trens, produção leiteira, animais silvestres, Veado e Caranguejo se entreolhando, fogão a lenha,  o Bar mais antigo do Brasil em funcionamento, Grupo José Bernardino e Praça Belfort de Carvalho, prédio da Prefeitura estão representados  na bela obra de arte.

Parabéns ao autor por produzir, de forma tão primorosa e  perspicaz, essa verdadeira síntese da história da Terra de André.

quinta-feira, 21 de dezembro de 2017

DISCOTECA VÊNUS – FATOS E LENDAS SOBRE A “BOATE VENENOSA”, QUE MARCOU A HISTÓRIA DE ANDRELÂNDIA




Impossível para aqueles que moraram ou visitavam Andrelândia durante as décadas de 1980-1990 não falar da Discoteca Vênus, a popular “Venenosa’, como carinhosamente a chamávamos, frequentada assiduamente pelos adolescentes e jovens que para lá se dirigiam em busca de paqueras e diversão.



Naqueles tempos, a música começava a tocar cedo (por volta das 19:00h) e todos chegavam de banho tomado, cheirosos, com a melhor roupa possível, de preferência com algum detalhe branco, para que realçasse quando fosse acesa a “luz negra”.

Por volta das 21:00h começava o momento mais esperado pelos frequentadores: a sessão de músicas lentas, quando os meninos chamavam as meninas para dançar, de rosto coladinho. Muitos jovens de Andrelândia deram o primeiro beijo em tal ocasião, ouvindo as melôs caprichosamente escolhidas pelo Renato Laredo, responsável pela sonorização do estabelecimento.


Lembro-me que, conquanto não houvesse regras a respeito, cada área do recinto era ocupada por determinada classe social, formando verdadeiros “continentes” de intercomunicação restrita, algo que nos dias de hoje seria, certamente, definido como racismo ou preconceito. Mas tudo era mais leve e descomplicado antigamente. Bons tempos.

Pontualmente às 21.55h Renato anunciava: esta é a última música para os menores.

Às 22:00h as luzes eram acesas e quase todos os menores de idade saíam. Fim da diversão.

   Os que tentavam driblar as regras, normalmente eram identificados e retirados ostensivamente do recinto pelo Zico, o proprietário, que tinha fama de mau entre a molecada.

    Os maiores podiam curtir um pouco mais, não raras vezes tomando uma (ou várias) cuba libre (rum com coca-cola) ou hi-fi (vodca com fanta laranja) no bar da Discoteca, administrado pelo Elói. Lembro-me de um pôster do Dire Straits na parede. Era o máximo.
          Os que não tinham dinheiro para os drinks mais sofisticados, como eu, faziam o “aquecimento” tomando umas cangibrinas no bar do Antônio Peru, ao lado da praça da estação. Depois, tentávamos obter um desconto na entrada, fazendo o maior chororô com a Dona Julita Gorgulho, mulher do Zico, que ficava na portaria. Perdíamos o maior tempo, mas fazia parte do ritual de ingresso no território venusiano. Na entrada, recebíamos um carimbo no pulso. Era a comprovação de que o ingresso havia sido pago.

       Uma lenda que corria na época era de que se todos pulassem dentro da Discoteca, o prédio cairia, pois não tinha estrutura. Verdade, ou não, fato é que o Zico sempre expulsava quem pulava lá dentro.
     Estas são minhas velhas reminiscências sobre a Venenosa, de saudosa memória.
            
Se você se lembrar de algo mais, comente aqui. Relembrar é viver.